1 de Maio de 2025

Já vi Ghost três vezes em Portugal. Três vezes. E adorei. O Sr. Tobias Forge, seja lá qual for a máscara ou personagem que esteja a usar no momento em que estejam a ler este meu “riff de opinião”, sabe exatamente o que faz.
O homem percebe de espetáculo como poucos. Tudo é pensado ao detalhe — desde o pano gigante que tapa a boca cénica e só cai no arranque do concerto, à estrutura narrativa que nos conduz por três actos até à apoteose final. É tudo milimetricamente encenado. E isso, para quem como eu gosta de música com conceito e de concertos que são mais do que só música, é de aplaudir.
Mas desta vez… NÃO FUI.
Não é por birra. Não é por snobismo. É mesmo porque, por muito que goste da banda, há limites. Primeiro, não gosto da sala. O Meo Arena (que já foi Pavilhão Atlântico, e que parece agora estar a caminho de ser da Live Nation) é um pesadelo acústico. Quem já lá esteve sabe: foi feito para congressos, feiras, exposições e, vá, eventualmente algum desporto. Mas música ao vivo?
Nem com todas as obras de melhoramento feitas ao longo dos anos — e olha que dizem que foram muitas. A verdade é que aquilo continua praticamente igual desde o meu primeiro concerto lá em 1998, com Marilyn Manson e Moonspell. Um marco? Sim. Um som decente? Não. Uma verdadeira panela de pressão!
Mas se a sala não ajuda, o modelo de evento ainda ajuda menos.
Golden Circle, o novo apartheid do rock?
O conceito do “Golden Circle” é uma aberração. Antigamente, pagavas o teu bilhete e se chegasses cedo, ficavas à frente. Agora, pagas um bilhete ainda mais caro para teres o “privilégio” de ouvir o concerto em condições. Porque é disso que se trata: no Meo Arena, se não estás no Golden Circle, ouves mal. Levas com reflexos, ecos, e uma sopa de frequências que não te deixa distinguir uma guitarra de um sintetizador.
E não me venham dizer que é por causa do conforto ou da experiência premium. Golden Circle não tem nada de exclusivo — ocupa praticamente meia sala. É uma maneira de te obrigarem a pagar mais para teres o mínimo. Isto já não é escolha. É extorsão!
Liberdade em extinção (com bolsa “hi-tech”)
E depois há esta moda que parece saída de um episódio de Black Mirror: proibir os telemóveis nos concertos.
Atenção: eu até percebo a ideia — queremos viver o momento, não estar a ver tudo através de ecrãs. Sim senhor. Mas o que me incomoda é o método: é proibido. Ponto. Metem-te o telemóvel numa bolsa “hi-tech” que só pode ser aberta no fim do espetáculo, e vendem isto como se fosse um luxo, um exclusivo, uma experiência superior.
Desculpa, mas isto não é um mimo. É controlo. E das duas, uma: ou achamos todos lindo e alinhamos, ou paramos um bocado para pensar.
Antigamente, bastava bom senso e camaradagem. Os metaleiros dos anos 90 e 2000 sabiam estar. Ninguém se punha a filmar o concerto inteiro com o braço esticado, a atrapalhar os outros. Havia respeito. Hoje em dia, o que há é imposição. A mesma lógica do “é para o teu bem”. Como as vacinas obrigatórias. Como a vigilância 24 horas. Como a ideia de que, um dia, até os medicamentos nos vão ser enfiados goela abaixo com um sorriso, “pela nossa/vossa saúde”.
Estamos a caminhar para uma distopia que, para muitos de nós, nem parece real — porque nunca conhecemos a verdadeira falta de liberdade. Mas quando se começa a pagar mais para ter acesso a um som decente, e a aceitar alegremente que nos vedem o uso de tecnologia pessoal… algo está mal. Muito mal.
Ghost e a metáfora perfeita
E é curioso que isto aconteça num concerto de Ghost. Uma banda onde toda a imagem gira à volta do oculto, do controlo, do culto, da manipulação. E onde, no fundo, só há uma pessoa a mandar — Tobias Forge. Os outros músicos são anónimos. Intercambiáveis. Ele é o Papa. O líder espiritual e criativo. É um génio?
Posso dizer que sim, É. Mas também é um microcosmos do que se passa no mundo cá fora. Um tipo com talento, visão e um exército de seguidores que aceitam tudo. Até a proibição! Por isso, desta vez não fui. E não me arrependo.
Não deixo de gostar de Ghost. Continuo a respeitar o trabalho de Tobias Forge. Mas também continuo a valorizar a minha liberdade — de escolha, de movimento, de ouvir um concerto como deve ser, e sim, de tirar uma fotografia com os amigos. De fazer um direto de 2 ou 3 musicas para o canal que é o máximo que sempre faço.
A experiência de um concerto não devia ser vendida aos bocadinhos. Nem devíamos aplaudir de pé a nossa própria censura.
Bruno da Costa aka Likes de um Metaleiro.
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